Alzheimer precoce e perda de memória em jovens

Atualizado pela última vez em 04/01/2024

Com frequência recebemos indivíduos relativamente jovens com queixas de memória. Eles têm receio de estarem desenvolvendo a doença de Alzheimer. Em geral, têm o pai ou a mãe idosos com a demência e acreditam que a genética já está se manifestando como doença. Vamos aqui entender as causas de perda de memória em jovens e como é o Alzheimer que aparece antes dos 60 anos.

Demência de Alzheimer tornou-se sinônimo de perda de memória

De todas as causas de declínio cognitivo, a doença de Alzheimer é a principal responsável, com mais de 70% de todos os casos. Em especial, na terceira idade a probabilidade de desenvolver essa patologia dobra a cada 5 anos a partir dos 65 anos de vida.

As primeiras regiões a sofrerem a atrofia pelo acúmulo de proteína tau no Alzheimer tardio se localizam na parte interna dos lobos temporais. Ali estão os hipocampos, estruturas responsáveis por vários mecanismos de memória. Tanto para a aquisição de novas memórias, como para a recuperação de informações gravadas, os hipocampos desempenham papel crucial e sua disfunção interfere diretamente na memória.

Por essa razão, no Alzheimer típico, os primeiros sintomas a aparecer são as dificuldades de memória. É por isso que quando alguém se percebe com perda de memória, logo se preocupa com a doença de Alzheimer.

Sintomas de perda de memória na doença de Alzheimer:

  • Esquecer episódios que aconteceram recentemente
  • Ficar repetitivo: conta as mesmas estórias ou faz as mesmas perguntas repetidas vezes
  • Esquece de compromissos agendados
  • Esquece datas relevantes
  • Tem dificuldade de se manter em dia com as atualidades
  • Pode ter dificuldade de reconhecer pessoas familiares
  • Desorientação no tempo e no espaço
  • Problemas para recontar estórias ou concatenar informações (memória lógica)
  • Dificuldade de aprender a utilizar eletrodomésticos novos ou celulares

Alzheimer precoce acontece antes dos 60 anos

Apenas 5% dos casos de doença de Alzheimer acontece antes dos 60 anos. Curiosamente, a primeira descrição da doença foi feita por Alois Alzheimer em 1906 e relatava o caso de uma senhora de 51 anos que manifestou a degeneração cerebral.

De fato, até a década de 1970 acreditava-se que o Alzheimer acometia apenas indivíduos jovens. Era conhecida, portanto, como uma demência pré-senil. Todavia, análises de cérebros de idosos com sinais de demência revelaram que as alterações patológicas eram semelhantes à doença descrita pelo médico alemão.

Em ambas manifestações da patologia, ocorre acúmulo de amilóide beta e da proteína tau no cérebro formando, respectivamente, as placas senis e os emaranhados neurofibrilares. Entretanto, no Alzheimer tardio o principal fator de risco é o envelhecimento do cérebro. Por outro lado, no Alzheimer precoce fatores como mutações genéticas desempenham papel mais importante.

As variantes do Alzheimer antes dos 60 anos

A forma típica da doença é aquela que começa comprometendo os sistemas de memória, gerando um déficit escalonado. Quer dizer, no início do Alzheimer típico a perda de memória é maior para episódios recentes do que para informações antigas. Porém, existem formas atípicas de Alzheimer que são bem mais frequentes nos indivíduos jovens que desenvolvem a doença.

Afasia logopênica é uma variante de Alzheimer

Uma variante bastante frequente é a Afasia Logopênica. Nessa forma de Alzheimer, a primeira dificuldade se manifesta na linguagem. A fala torna-se hesitante, com algumas interrupções. O paciente tem dificuldade de lembrar do nome das coisas. Além disso, caracteristicamente torna-se incapaz de repetir frases mais longas a pedido do examinador. Posteriormente, com o avançar da doença outras funções cerebrais serão comprometidas pela degeneração neurológica.

Quando encontramos um paciente com um distúrbio de linguagem progressivo, pensamos também em outras doenças. Além da Afasia Logopênica do Alzheimer, a Degeneração Frontotemporal também pode se manifestar como afasia primária. Na Demência Frontotemporal existem dois tipos de afasias: a não-fluente e a semântica.

É importante pensar na demência frontotemporal porque ela é a segunda causa mais frequente de demência degenerativa antes dos 60 anos. O Alzheimer precoce é ligeiramente mais prevalente e afeta 24 pessoas por 100.000 habitantes nos EUA. Já a demência frontotemporal afeta entre 18 e 22 indivíduos por 100.000. A diferença é pouca e ambas as doenças são bastante raras.

Atrofia cortical posterior também é uma forma atípica de Alzheimer

Alguns pacientes com Alzheimer precoce manifestam a forma de Atrofia Cortical Posterior. Nessa variante, a atrofia afeta especialmente as regiões posteriores do cérebro. O comprometimento dos lobos occipitais e parietais atrapalha a percepção e processamento de imagens visuais.

Os pacientes iniciam os sintomas da doença com dificuldade de perceber informações visuais. Podem ter dificuldades de localizar objetos em uma sala. Também podem ter dificuldades de seguir visualmente um objeto que se move. Além disso podem não conseguir identificar simultaneamente vários objetos em um cenário. Quando pedimos para o paciente descrever uma figura complexa, ele pode negligenciar elementos relevantes.

Quando a atrofia se estende para as porções inferiores dos lobos occipitais e temporais, a dificuldade maior é de reconhecer objetos pela forma. Curiosamente, o paciente pode ter problemas para reconhecer rostos familiares, uma condição denominada prosopagnosia.

Outras variantes de Alzheimer

Além das duas mencionadas acima, o Alzheimer ainda pode se manifestar de outras formas consideradas atípicas. Entre elas, destacamos a forma disexecutiva que se evidencia por dificuldade de planejamento e organização, bem como alterações comportamentais.

Outra forma menos frequente é a chamada de Acalculia na qual a doença se manifesta por dificuldade de fazer cálculos, reconhecer a direita e a esquerda e não consegue se localizar quanto a partes do próprio corpo, como os dedos das mãos.

O importante é saber que nas formas precoces da doença de Alzheimer, as manifestações são em geral diferentes da forma tardia. A doença tende a ser mais agressiva e evoluir mais rapidamente. O diagnóstico é realizado por profissional competente em identificar as variações da doença.

A importância da genética no Alzheimer precoce

Já falamos que o principal fator de risco para o Alzheimer tardio é o envelhecimento. Obviamente a idade não tem o mesmo peso no Alzheimer precoce.

Em cerca de 10% dos casos de Alzheimer precoce é possível encontrar mutações genéticas que determinam a doença. Os 3 genes mais importantes nesses casos são: gene da APP (proteína precursora de amilóide), presenilina 1 e presenilina 2.

Indivíduos portadores de Alzheimer precoce relacionados a mutações nesses três genes podem ter outros membros da família comprometidos. O aspecto familiar hereditário é bem mais evidente nesses pacientes. As mutações isoladas nesses genes podem produzir a doença completa. Portanto, são considerados causas diretas da patologia. Essas mutações não são vistas no Alzheimer de início tardio.

Além dos genes de alto impacto, existem outros genes que aumentam o risco de Alzheimer precoce. O principal deles é o da Apolipoproteína E (APOE), com dois alelos épsilon 4 conferindo o maior risco. Cerca de 10% dos pacientes com a demência são portadores desse padrão genético.

Entre as mutações reconhecidas como de baixo impacto, existem a SORL1, ABCA7, PLD3, PSD2, TCIRG1, RIN3, e RUFY1. Estudos mostram que uma composição de perfil de risco com esses genes pode prever a doença com 75% de acurácia.

Principais causas de perda de memória antes dos 60 anos

As principais causas de queixa de memória antes dos 60 anos não envolvem o Alzheimer precoce ou outras doenças degenerativas. Para alívio da maior parte dos pacientes, os problemas de memória antes dos 60 anos são potencialmente reversíveis.

Na maior parte das vezes, a dificuldade de memória em indivíduos adultos decorre de problemas clínicos ou comportamentais. A depressão é um importante causador de dificuldades de concentração, atenção e memória. A sobrecarga de trabalho pode levar a um estado de esgotamento (burnout) que afeta o desempenho cognitivo como um todo.

Além dos fatores mencionados, a privação de sono, a apnéia obstrutiva do sono e o estresse crônico também interferem negativamente no funcionamento cerebral.

Quando o paciente chega ao nosso consultório, colhemos uma história detalhada e aplicamos testes cognitivos. Não raramente descobrimos que a memória está boa e o que está afetado é algum outro domínio, como a atenção ou as funções executivas. Várias vezes fiz diagnóstico de TDAH (Déficit de Atenção e Hiperatividade) em adultos que não foi identificado na infância.

Na investigação, é necessário solicitar exames de sangue para avaliar problemas hormonais e deficiência de vitaminas. Nem sempre a ressonância magnética será necessária.

Causas possíveis de perda de memória em adultos não-idosos:

  • Comportamentais: depressão, estresse crônico, ansiedade, sobrecarga de trabalho, TDAH
  • Distúrbios de sono: privação de sono, apnéia obstrutiva do sono, fibromialgia
  • Bioquímico-metabólicas: hipotireoidismo, deficiência de B12, deficiência de tiamina, obesidade, diabéticos descompensados, insuficiência cardíaca ou pulmonar
  • Cardiovasculares: acidentes vasculares encefálicos, hipertensão arterial, doenças de pequenos vasos, CADASIL
  • Infecciosas: sífilis, HIV, HSV, HZV, doenças priônicas
  • Inflamatórias: vasculites, esclerose múltipla etc
  • Causas variadas: neoplasias intracranianas, linfoma intravascular, doenças degenerativas

O que fazer com o medo de ter Alzheimer precoce?

Vimos que Alzheimer precoce é diferente de Alzheimer tardio. No Alzheimer tardio, o principal fator de risco é a idade avançada. Isso significa que se você tem o pai ou a mãe com Alzheimer que se iniciou depois dos 65 anos, a sua chance de ter a doença é maior quando você ficar velho(a). Antes dos 60 anos, caso exista mesmo uma dificuldade de memória, ela provavelmente se deve a outro problema. Procure um médico especialista para descobrir o que está acontecendo.

Por questões éticas, não se recomenda fazer testes genéticos em pessoas sadias para ver o risco de ter Alzheimer. Mesmo que tenha um parente próximo com a doença, os testes genéticos não mudarão a conduta do médico. Por isso, esses testes não são solicitados.

Você pode diminuir sua chance de ter Alzheimer na terceira idade. Existem fatores, como o diabetes, que aumentam muito o risco do Alzheimer tardio. O diabetes modifica a barreira hematoencefálica e causa outras alterações que propiciam o aparecimento da demência.

O principal fator de risco para o diabetes tipo II é a obesidade. Portanto, perder peso e se manter saudável por diminuir o risco do diabetes e, por consequência, do Alzheimer. Além disso, o controle da hipertensão arterial, do colesterol e do diabetes ajudam a prevenir o problema.

A atividade física regular durante toda a vida é uma prevenção contra o Alzheimer. Uma dieta saudável, como a mediterrânea melhora as condições de trabalho do cérebro e do corpo.

Seguindo esses conselhos, sua vida será melhor, você diminuirá o risco de Alzheimer e provavelmente poupará sua família dessa dor.

Roger Taussig Soares
Neurologista – São Paulo
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Dr. Roger Soares é médico neurologista, nascido em 1968 no Paraná. Mora em São Paulo há mais de 30 anos e é médico credenciado dos maiores hospitais da capital paulista. Atualmente se dedica exclusivamente ao tratamento de seus pacientes particulares no consultório no Tatuapé. Gosta de escrever, aprender e provocar reflexões. "Conhecimento verdadeiro é saber a extensão da própria ignorância." Confúcio

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