Demências reversíveis: o pseudo-alzheimer

Atualizado pela última vez em 04/01/2024

Tão importante quanto fazer o diagnóstico de Alzheimer é duvidar dele. Certamente o Alzheimer é a principal causa de demência degenerativa em idosos e sua frequência é tão alta que pensar em Alzheimer diante de um declínio cognitivo progressivo é acertar na maior parte das vezes. Todavia, existem outras doenças que podem se apresentar com sintomas semelhantes a Alzheimer e que são potencialmente reversíveis se tratadas adequadamente. Por isso, antes de se concluir pelo diagnóstico de Alzheimer necessitamos ativamente descartar outras doenças.

Se considerarmos especialmente as pessoas com mais idade, temos certas patologias que devem ser pensadas na diferenciação das causas para a perda de memória. A depressão no idoso é uma delas e pode se manifestar como uma pseudodemência. Diferentemente do indivíduo jovem, o idoso muitas vezes não manifesta um quadro de depressão tão evidente, com choro constante, muita tristeza e pensamentos de morte. Não é incomum encontrarmos idosos deprimidos que apenas se queixam de dores pelo corpo, incômodo e mal-estar gerais, alterações de sono, sensação de falta de energia ou vontade apenas de ficar em casa.

Existem escalas utilizadas para detectar a depressão no idoso, tais como a GDS, que auxiliam o médico especialista a revelar o problema. Mais importante ainda é o fato que uma das principais queixas do idoso com depressão é a perda de memória com dificuldade de concentração. Esses sintomas podem levar ao diagnóstico precipitado de Alzheimer e confundir o tratamento. Outro fator importante a se levar em conta é que os medicamentos antidepressivos demoram mais para ter efeito em pessoas com mais idade.

Ao se avaliar um idoso com queixas de memória e cognição temos também que pensar em alterações hormonais e metabólicas, responsáveis igualmente por sintomas na esfera cognitiva e do comportamento. Um exemplo disso é o hipotireoidismo. A diminuição da função da tireóide pode causar sonolência e confusão mental. Do mesmo modo, o diabetes mal controlado e quedas de pressão não identificadas podem levar a flutuações do nível de consciência e devem ser pesquisadas. Alterações do nível de cortisol por deficiência das glândulas supra-renais também podem afetar as funções cerebrais.

Em muitos casos, necessitamos coletar o líquido céfalo-raquidiano, o “líquido da coluna” para identificar vários tipos de doenças como inflamações, infecções e até neoplasias que envolvem o sistema nervoso central. Entre as doenças infecciosas lembramos da sífilis que embora mais rara nos dias de hoje pode ser responsável por alterações cerebrais muitos anos depois do momento da contaminação. A criptococose, a toxoplasmose e a listeriose podem levar a alterações cognitivas de evolução mais rápida mas merecem ser consideradas. Do mesmo modo, as infecções por HIV tem crescido em termos de prevalência entre pessoas com mais idade talvez pelo uso de medicamentos para disfunção erétil e pelo menor hábito de uso de preservativos para uma relação sexual segura.

Várias neoplasias(cânceres) de outras partes do corpo podem levar a sintomas neurológicos à distância. São as chamadas síndromes paraneoplásicas do sistema nervoso central. Seu diagnóstico só é possível quando o médico pensa sobre a condição e pede exames específicos. Do mesmo modo, doenças autoimunes podem causar alterações neurológicas pela produção de anticorpos direcionados contra as células nervosas e podem ser tratadas com medicações que diminuem o ataque imunológico.

A doença de Alzheimer é uma doença degenerativa para a qual ainda não temos um tratamento curativo. Os medicamentos disponíveis atualmente ajudam a diminuir um pouco os sintomas comportamentais e cognitivos mas não devolvem o paciente ao estado normal. Embora algumas medicações possam diminuir levemente a progressão da doença, todos os pacientes experimento a evolução dos sintomas e chegarão às fases finais do Alzheimer. Pesquisar outras causas de demência é fundamental pois a intenção de tratamento muda e ao invés de planejar o cuidado de uma doença degenerativa como o Alzheimer, podemos ter a chance de tratar algo potencialmente reversível.

Dr. Roger Taussig Soares
neurologista
crm 69239 SP

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Dr. Roger Soares é médico neurologista, nascido em 1968 no Paraná. Mora em São Paulo há mais de 30 anos e é médico credenciado dos maiores hospitais da capital paulista. Atualmente se dedica exclusivamente ao tratamento de seus pacientes particulares no consultório no Tatuapé. Gosta de escrever, aprender e provocar reflexões. "Conhecimento verdadeiro é saber a extensão da própria ignorância." Confúcio

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